
Com missão de contribuir para redução das violências e desigualdades que marcam a vida das mulheres nas ciências, por meio de um observatório, três incubadoras sociais, uma linha de ação extensionista e uma política de comunicação científica feminista, o INCT Caleidoscópio: Instituto de Estudos Avançados em Iniquidades, Desigualdades e Violências de Gênero e Sexualidade e suas Múltiplas Insurgências foi fundado em 2023.
O Observatório Caleidoscópio, com coordenações regionais Sul-Sudeste, Norte-Nordeste e Centro-Oeste, dedica-se à produção de indicadores do histórico da inserção de mulheres nas ciências e ao mapeamento de iniciativas exitosas nas universidades e institutos de pesquisa, incluindo vínculos entre trajetórias exemplares e políticas públicas. A nucleação Sul-Sudeste do INCT foi a primeira a implementar uma coordenação do Observatório e já entregou levantamentos de dados e realizou seminários e workshops, que são detalhados nas notícias na página do Observatório no site do INCT. O Observatório tem nucleado também a maior parte das iniciativas de comunicação do INCT.
As incubadoras sociais do INCT, em nucleações regionais Sul-Sudeste, Norte-Nordeste e Centro-Oeste, dedicam-se a apoiar projetos de jovens pesquisadoras, fomentando relações intergeracionais entre pesquisadoras em diferentes estágios de formação (do pós-doutorado ao ensino médio) e investindo em extensão universitária. Queremos favorecer o interesse das meninas do ensino médio pelo ensino superior, da graduação pela pós-graduação, e apoiar jovens recém doutoras com um ambiente seguro e estimulante para a realização de seus projetos de pesquisa. A nucleação Norte-Nordeste foi a primeira a implementar sua incubadora, iniciativa que, no âmbito do INCT Caleidoscópio, tem como missão desenvolver tecnologias sociais para prevenção das violências interseccionais nas universidades e de suporte às trajetórias educacionais de mulheres estudantes universitárias pertencentes a grupos minorizados, levando em consideração marcadores de gênero, raça, etnia e territorialidade.
Conforme previsto no plano de trabalho do INCT, no mês de abril de 2025 foram realizadas as oficinas de compartilhamento dos conhecimentos e práticas acumulados pela coordenação Sul-Sudeste do Observatório Caleidoscópio, por um lado, e pela Incubadora Norte-Nordeste do INCT, por outro, para a ampliação das duas iniciativas, chegando às três coordenações regionais do Instituto. E assim demos início, com coordenação na Universidade de Brasília, à instalação da Incubadora Centro-Oeste do INCT e da coordenação Centro-Oeste do Observatório Caleidoscópio.
A fim de conduzir a implantação da Incubadora e da coordenação do Observatório no Centro-Oeste de forma participativa com colegas feministas da região, convocamos reunião e elaboramos desde a coordenação um questionário para levantamento de interesses e vínculos das colegas. O questionário nos permitiu conhecer as principais temáticas de interesse desse grupo inicial da nucleação regional, e foi encaminhada pelas participantes a formação de Grupos Temáticos segundo os interesses pelos temas elencados na consulta.
Os temas listados buscaram relacionar a missão do INCT aos interesses de investigação e grupos de pesquisa já existentes na região, e com isso pretendemos lograr uma articulação orgânica para a emergência de uma nucleação que possa prosperar. Os temas foram: “Interseccionalidade e segregação urbana no acesso à educação média e superior”, com adesão de colegas da UnB, da UFG e da UFMS; “Desigualdades de gênero e sexualidade nos ambientes organizacionais das IES”, com presença de colegas das mesmas universidades mais a UEMS; “Maternidade na vida acadêmica”, com UnB, UFG, IFB e UFMS; “Histórias e memórias de mulheres: educação e visibilidade”, a que aderiram colegas da UnB, da UEMS, da UFMS, da UFG e do IFB; “Saúde das mulheres nas IES”, articulando pesquisadoras da UFG e da UnB; “Interseccionalidade, violência e assédio nas IES”, grupo restrito a pesquisadoras da UnB no momento; “Letramento racial nas escolas e IES”, congregando UFG, IFB e UnB; “Direitos de povos indígenas e tradicionais, interseccionalidade e acesso às IES”, com colegas da UEMS e da UnB; e “Privação de liberdade e acesso a políticas educacionais”, de que participam UnB, UFG e UFMT.
Como se nota, um desafio inicial da nucleação é atrair colegas de outras instituições na região, e para isso trabalhamos em cada coordenação de grupo temático. Para cada GT, pelo menos uma pesquisadora voluntariou-se a coordenar e, com auxílio da coordenação regional, começam a ser realizadas as reuniões dos grupos, com seus primeiros encaminhamentos. Quatro GTs já avançaram nesse sentido ainda durante o mês de maio.
Grupos Temáticos como estratégia de ramificação
Em reunião no dia 8 de abril de 2025, propôs-se que os Grupos Temáticos se reunissem periodicamente para conhecer a fundo os interesses de cada participante, a fim de traçar metas e desenhar ações conjuntas. Partimos do entendimento de que o trabalho pode ser melhor aproveitado quando realizado em grupos menores, com interesses e experiências em comum, de modo que as participantes possam contribuir com suas expertises e o aprendizado seja mútuo.
No dia 6, reuniu-se o GT Saúde das mulheres nas IES com presença de Jacqueline Fiuza, Mariana Prandini, Silvia Badim. As participantes do GT idealizaram o desenvolvimento de um projeto de pesquisa conjunto, reunindo várias pesquisadoras de diferentes instituições do Centro-Oeste e diferentes estágios acadêmicos, procurando enredar pesquisadoras desde a iniciação científica até às sêniores. A sugestão inicial foi realizar um mapeamento de programas de promoção à saúde da mulher em IES do Centro-Oeste, gerando dados para o Observatório Caleidoscópio. O grupo ainda irá decidir sobre o instrumento de coleta de dados a ser utilizado, mas o primeiro passo será o levantamento bibliográfico de trabalhos escritos sobre o tema da saúde das mulheres em instituições de ensino superior.
No dia seguinte, 7 de maio, o GT Direitos de povos indígenas e tradicionais, interseccionalidade e acesso às IES reuniu Ela Wiecko, Flávia Belmont, Nanah Sanches, Tchella Maso e Viviane Resende. Os principais encaminhamentos foram o estabelecimento de contato com o Conselho Indigenista Missionário acerca de pesquisa que já vem realizando sobre violência contra pessoas indígenas em IES brasileiras, o convite a mais pessoas para integrar o GT, especialmente indígenas e pessoas de outros estados da região Centro-Oeste, a massiva divulgação das bolsas destinadas a mulheres indígenas com editais abertos no INCT; proposta de conversas com lideranças que atuam no grupo executivo federal e o estabelecimento de reuniões mensais fixas, com possibilidade de encontros adicionais conforme necessidade.
Em 8 de maio foi a vez de se reunir o GT Histórias e memórias de mulheres: educação e visibilidade, com presença de Adriana Kató, Dulceli Estacheski, Jacqueline Fiuza e Silvéria Sant. A reunião teve como foco a apresentação das trajetórias e temas de pesquisa das participantes, com destaque para temas como: corpos que menstruam, mulheres migrantes e trans, violência de gênero, suicídio, parteiras tradicionais, resistência negra e feminina, arte, transmigração, decolonialidade e história oral. Inspiradas por iniciativa já existente na UFMS, foi proposta a criação de um projeto de pesquisa e extensão regional, envolvendo toda a região Centro-Oeste para registrar e valorizar histórias e memórias de mulheres a partir de suas territorialidades, deslocamentos e experiências de vida. Outras possíveis atividades mencionadas foram rodas de conversa com mulheres de diferentes gerações e contextos (escolas, universidades, comunidades), produção de conteúdos diversos, como textos acadêmicos, podcasts e videocasts, com apoio de oficinas de capacitação audiovisual e criação de um repositório. Será elaborado um cronograma de trabalho do GT para as próximas agendas.

GT Histórias e Memórias de Mulheres: Educação e Visibilidade. Imagem: Viviane Resende.
Por fim, o quarto GT que já realizou sua primeira reunião foi o GT “Letramento racial nas escolas e IES”, que em 13 de maio deliberou pela mudança de nome do GT para Tecnologias de Enfrentamento a Racismos em Escolas e IES. Estiveram presentes Dayane Augusta Silva, Izabel Magalhães, Jacqueline Fiuza e Joana Plaza Pinto. Com objetivo iniciar o planejamento das ações do GT, refletiram sobre o caráter transversal da questão racial e a importância de se desenvolverem tecnologias sociais de enfrentamento ao racismo. Houve um consenso de que a abordagem interseccional entre raça, gênero e opressões coloniais deve guiar o trabalho do grupo. O grupo também discutiu a inclusão de bolsistas de graduação e ensino médio para colaborar em oficinas, ciclos de leitura e produção de conteúdo de comunicação científica comunitária (textos, vídeos, podcasts). Foi encaminhada a adaptação de projeto de oficinas colaborativas já experimentado na UFG e no IFG, além da realização de oficinas e ciclos de leitura; produção de conteúdos científicos e comunitários sobre o enfrentamento ao racismo; reuniões de transferência da experiência da UFG e IFG já citada.
Os demais grupos temáticos deverão se reunir em breve, e com os encaminhamentos propostos e a colaboração preciosa das coordenadoras de cada grupo, a Nucleação Centro-Oeste do INCT Caleidoscópio anima-se a integrar as iniciativas pioneiras das colegas das nucleações Norte-Nordeste e Sul-Sudeste.
Ações da nucleação junto a coletivos de indígenas LGBTQIAPN+
Os temas elencados em nossa nucleação baseiam-se não apenas nos objetivos e metas propostos no projeto do INCT Caleidoscópio, mas também nos interesses de pesquisa das pessoas que dela participam. Neste momento inicial da nucleação, queremos ressaltar as ações junto a coletivos de indígenas LGBTQIAPN+, sigla que se refere a pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis, queers, intersexuais, assexuais, pansexuais, não-binárias e outras identidades dissidentes.
Umas das primeiras ações em que a nucleação se envolveu foi o Seminário Regional de Consulta, no âmbito do projeto Tecendo Direitos: Uma Estratégia Nacional para Indígenas LGBTQIA+, da Secretaria Nacional de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas (MPI). Realizado em 20 e 23 de fevereiro de 2025, na Aldeia Meruri, MT, o Seminário teve o objetivo primeiro de escutar indígenas LGBTQIAPN+, suas experiências e demandas. A partir disso, então, elaborar proposições para políticas públicas que levem em consideração a especificidade de indígenas LGBTQIAPN+ quando se trata de aspectos como territorialidade, empregabilidade, renda, saúde, educação etc. Nossa nucleação, por meio de suas pesquisadoras, esteve presente para apoiar o evento, “acompanhando e auxiliando nos processos de relatoria e na escuta ativa das demandas das comunidades, participando ativamente da construção desse processo consultivo desde o início” (INCT CALEIDOSCÓPIO, 2025).
Ainda no mesmo contexto do Seminário, a nucleação Centro-Oeste do INCT também atuou em sua segunda etapa, realizada na aldeia indígena Monguba, terra indígena Pitaguary, Ceará, nos dias 20 e 23 de março de 2025. Ficaram ainda mais evidentes nas discussões a saúde, a empregabilidade e a territorialidade, assuntos caros a indígenas nesse recorte.
Graças à participação no passo anterior, o papel da nucleação foi muito mais acentuado nesta segunda etapa. A Rede Arandu não só participou e ouviu as demandas, ficou responsável por elaborar um documento em que se relatem as discussões promovidas no seminário, o que pode ajudar a lograr a elaboração de políticas públicas para indígenas LGBTQIAPN+.
Em virtude da participação no Seminário Regional de Consulta, foi elaborado o curso de extensão Tecendo Relatos, Defendendo a Vida: formação em relatoria popular de direitos indígenas, em parceria com a Rede Arandu. O objetivo do curso é apoiar a produção de relatórios de direitos humanos que fortaleçam políticas públicas interseccionais e sensíveis às realidades dos territórios. Em modalidade online, a atividade, que ocorre enquanto escrevemos este texto (de 12 de maio a 29 de agosto deste ano), se divide em cinco encontros que discutirão fundamentos de uma relatoria de qualidade, princípios das políticas públicas, noções básicas sobre direitos humanos e dos povos indígenas e terminará com atividade prática de análise e elaboração coletiva de relatos. O público esperado são pessoas indígenas ou não, que participam do seminário regional.
Com a Arandu – Rede Colaborativa de Pesquisa: Povos Indígenas, Gênero e Sexualidade, o Brasília Research Center – Rede Earth System Governance, o Coletivo TYBYRA e o Grupo de Pesquisa em Relações Internacionais e Meio Ambiente (GERIMA-UFRGS), o INCT apoiou a cartilha Pessoas indígenas LGBTQIAPN+ e a luta por justiça climática: Um lugar na mesa de negociação. Nesta cartilha, é ressaltada a importância de levar em consideração as experiências de gênero, sexualidade e territorialidade de indígenas quando da formulação de estratégias para o combate à crise climática no cenário brasileiro, especialmente por que neste ano o país sediará a COP30. Os temas desenvolvidos ao longo da cartilha são a relação entre os direitos humanos e a emergência climática, as negociações sobre clima e a COP30 no Brasil, as lutas indígenas LGBTQIAPN+ e a Política Climática da política climática brasileira.
Mais recentemente, ressaltamos atividades no Acampamento Terra Livre, que ocorreu em Brasília, de 7 a 11 de abril de 2025, em atos de diversidade que rememoraram indígenas LGBTQIAPN+ que foram mortas em razão de sua identidade de gênero e/ou sexualidade. Os atos buscaram não apenas relembrar, mas principalmente reafirmar a existência e a importância de pessoas indígenas nesse recorte. Além disso, a Rede Arandu escutou diversas pessoas indígenas e as questionou acerca do movimento indígena e suas realidades nos territórios, bem como suas percepções sobre o Acampamento Terra Livre. Essas interações foram gravadas em mais de quinze entrevistas que servirão de base para episódios de podcast do INCT Caleidoscópio.
Notamos que é necessário avançar nas relações com nossos pares na região, a fim de congregar pessoas interessadas em fazer pesquisa feminista sobre indicadores de violência e ações exitosas de instituições públicas de ensino, ou aquelas que já têm experiência nesse campo, de quem podemos aprender muito. Tentamos ultrapassar esse desafio incentivando as participantes a convidar outras colegas que teriam desejo em trabalhar conjuntamente, e assim estamos expandindo nosso alcance.
Ainda estamos no início de nossas atividades, mas acreditamos que as pequenas equipes, reunidas em Grupos Temáticos, são a chave para alcançar os objetivos que propusemos. Cada GT está trazendo suas contribuições à nucleação.
Por fim, devemos agradecer aos coletivos de indígenas LGBTQIAPN+ com os quais temos atuado. Certamente sua participação traz à nossa nucleação uma especificidade da relação gênero-sexualidade, que precisa ser explorada, assim como as outras nucleações fizeram com gênero-raça.
Referência bibliográfica
INCT CALEIDOSCÓPIO. Seminário Regional de Consulta “Tecendo Direitos: Uma Estratégia
Nacional para Indígenas LGBTQIA+” é realizado na Aldeia Meruri. Disponível em:
https://www.caleidoscopio.unb.br/publicacoes/106-semina-rio-regional-de-consulta tecendo-direitos-uma-estrategia-nacional-para-indi-genas-lgbtqia-e-realizado-na-aldeia meruri. Acesso em: 17/05/2025

Viviane de Melo Resende é Coordenadora do INCT Caleidoscópio. Doutora em Linguística (Linguagem e Sociedade) pela Universidade de Brasília (UnB), professora associada do Departamento de Linguística, Português e Línguas Clássicas (LIP/UnB). É pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Linguística (PPGL/UnB). Coordenadora do Laboratório de Estudos Críticos do Discurso (LabEC/UnB) e vice-coordenadora do Núcleo de Estudos de Linguagem e Sociedade (NELiS/Ceam/UnB).

Raylton Carlos de Lima Tavares é Técnico do INCT Caleidoscópio. Doutorando em Linguística na Universidade de Brasília (UnB), com período sanduíche no Centre of Discourse Studies, na Espanha. Faz parte da Rede Discurso e Gênero, no âmbito da Associação Latino-Americana de Estudos do Discurso (ALED). Foi professor do Departamento de Linguística, Português e Línguas Clássicas da UnB e da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF).

Laísa Raquel Martins é graduada em Secretariado Executivo, com especialidade em projetos institucionais, projetos de pesquisa e projetos de extensão.
